terça-feira, setembro 30, 2008

AMOR EM REVOLTA !...


Já não estávamos sós Amor tudo mudava
será que tudo mudava meu Amor
só porque o vento
em turbilhão se enrodilhava nessas velas

nesses moinhos em cujos braços se entregava
D. Quixote ajoalhado junto ao túmulo
da sua Dulcineia que dormia

e envergonhada Amor também sorria
do amor que D. Quixote lhe ofertava

e por que paravam então os moinhos meu Amor
se o vento tão forte em vendaval
dentro das asas que D. Quixote idealizava ?...

Entre comícios entre gritos de revolta
que as nossas mãos nas tuas mãos enlouqueciam
nessa aventura onde se desprendiam as amarras
onde os nossos cabelos em desalinho
se soltavam

seria meu Amor meu grande Amor
a nona sinfonia de Beethoven

que entre duas canções de amor
nos embalava ?...

Seria apenas Amor esse sabor
esse eterno sabor a desconhecido que nos adulava
nas pontas das baionetas que suspensas
transbordavam através dos jardins da imensidão
nos aromas de uma canção simples e pura ?...

Que por ser de intervensão Amor por ser tão simples
nos assombrava meu Amor e em desespero
nos sossegava meu Amor

nos sossegava !...

e meu Amor nós recriávamos as gaivotas
num imenso quadro de Gauguin ou de Van Gogh
porque as inventávamos na vermelhidão do nosso Amor
que impetuosamente à noitinha regressava

e ficávamos sós Amor
outra vez sós
entregues a uma desconhecida angústia que amanhecia
junto aos cravos que carinhosamente colocávamos
sobre as teclas de um piano que tocava

novamente para nós amor
só para nós !...

Soletrávamos Sarte nos intervalos do dilúvio
reinventávamos Camus meu Amor a horas mortas
quando no absurdo o misturávamos em sossego
entre dois copos de uísque bem gelado

com um concerto de Mozart que irrompia pela noite
na obscuridade do sofá onde fazíamos
amor até altas madrugadas

e ninguém nos via
quando Mozart se misturava com Camus

e Sarte ficava assim tão sorridente
contemplando a ingenuidade do nosso amor

a nossa ingenuidade amor !...
A nossa ingenuidade !..

Dormíamos a sono solto Amor
porque dormíamos
com Che Guevara à cabeceira iluminado
no altar das nossas próprias indecisões

abraçados meu Amor sempre abraçados
enviesados na sofreguidão com que vivíamos
as ressacas que nas vésperas eram sentidas
nos vergões que nos acalmavam as madrugadas

Éramos heróis por alguns dias Amor
só alguns dias
enquanto a chama se chamava liberdade

e esquecíamo-nos meu Amor tudo esquecíamos
quando já tarde já muito tarde nos entregávamos
aos acordes solitários dos violinos

que bem longe amor lá muito longe
quase em surdina meu Amor muito baixinho
voltavam a tocar tranquilamente

tão sereníssimos Amor !...
Tão devagar !...

e ao sabor das apetecidas coisas que inventávamos
íamos procurando amor nas nossas mãos vazias
uma a uma as flores que se queriam libertadas
e que aprisionadas nos sorriam Amor

como sorriam !...

Fernanda Costa

Lisboa, 30 de Setembro de 2008
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sábado, setembro 20, 2008

AMOR ADIADO


Entre sussuros entre ameaças de desgraça
ouviam-se ao longe as flautas os tambores
ocultando os violinos Amor que em sossego
choravam perdidamente de amor por serem breves.

Choravam por todos os amores prostituídos
que nos cabelos já desgrenhados se vendiam
junto às espingardas que em nossos corpos se enlaçavam

e ficavam sem amor porque sofriam
adiávamos tudo amor tudo adiávamos
nas baladas que misteriosamente nos percorriam

eram quebradas todas as margens que nos chamavam
entre blusões e calças jeans que se rasgavam
para nos amarmos em todos aqueles que ao partirem
se aconchegavam junto às lágrimas que doíam

germinando nas pálpebras amigas meu Amor
de todos os que embora inteiros
ainda viviam !...

e nós desesperávamos Amor porque sonhávamos
adiando todo esse amor que se perdia
num adágio de Tchaikovsky que soava
entre duas violas pachorrentas que m0rriam

que ainda morriam de amor
enquanto esperávamos

e enquanto esperávamos meu Amor
nós resistiamos !...

Era o amor meu Amor que se apagava
nos ventos solitários que longe lá muito longe
nos seduziam

era o amor meu Amor que se anunciava
num Maio de Sessenta e Oito que nos gritava
húmido de preces em todos os lençóis onde dormíamos

onde dormiamos Amor desesperados
e em desespero morríamos Amor

como morríamos !...

Chorávamos como Tristão chorava
por Isolda !...

Iamo-nos inspirando meu Amor devagarinho
num quadro de Picasso inacabado
em Guernica seguindo os passos do inferno
que os nossos corpos soluçantes atormentavam

desvendávamo-nos para além da solidão
e embriagados aos solavacos nos beijávamos
recordando ao serão Amor a nossa infância
bem juntinhos a uma valsa de Strauss

afectuosa infância meu Amor que escondiamos

nas algemas onde apressadamente envelhecíamos

e esboçávamos sempre mais um sorriso meu Amor
enigmático e ténue sorriso que lembrava
os dedos de Da Vinci desenhando
os lábios de uma Gioconda que sofria

e que sorria como nós Amor
como sorria !...

a Gioconda onde Da Vinci se eternizava.

Fernanda Costa

Lisboa, 2o de Setembro de 2008
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sábado, setembro 13, 2008

AMOR PROIBIDO


Pressentiam-se os violinos no silêncio
desse amor que já fora de Pedro e Inês.

Mas nós caminhávamos ausentes meu Amor
suspensos de uma certa flor que renascia
nos gestos adivinhados que nunca acontecendo
serenamente em segredo quase que aconteciam.

Até que dentro de nós por fim se iniciasse
essa imensa e estranha ode à alegria
que Beethoven junto a nós se esforçava
por trazer entre os dedos entre estes lábios
essa força de reunir todos os dias
num só dia Amor !... apenas num só dia !...

Mas nós Amor sozinhos estremecíamos
ficavamos presos às teclas de um piano que tocava
naquelas madrugadas já frias tão distantes
um místico nocturno de Chopin que de tão triste
entristecia aquelas manhãs da nossa ausência Amor.

Como era triste !...

Como era triste Amor a nossa ausência
quando Chopin se cobria de negro e resistia
nos nossos olhos já húmidos de cansaço
e sofria sozinho Amor.

Como sofria !...

E nós adormecíamos tão longe das nossas mãos
que Deus já distraído Amor se esquecia
de tudo o que em nós quase que acontecendo
nunca acontecia Amor !... nunca acontecia !...

Éramos Romeu e Julieta entre grinaldas
entre cambraias e cetins entre açucenas
suspirávamos de Amor como convinha
a tanto Amor a tanta ilusão comprometida.

E sempre sorrindo amor nós respirávamos
os sorrisos que inventávamos mansamente
junto às suavíssimas mãos que nos cercavam
aquela tão pequenina lágrima que partia.

Era o Amor que ausentando-se de nós Amor
nos magoava !...
Era o Amor que ausentando-se de nós Amor
tanto nos feria !...

E nós amor sentados ao piano nas madrugadas
com as minhas mãos nas tuas mãos nas nossas mãos
espreguiçávamo-nos em todas as inspirações que nos exaltavam
distribuíamo-nos em todos os sorrisos com que sorríamos.

E como sorríamos Amor !...
como sorríamos !...

Fernanda Costa

Lisboa, 13 de Setembro de 2008
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sexta-feira, setembro 05, 2008

AMOR RENASCIDO


Entre Galáxicas meu Amor vislumbramos
nesta sofreguidão do espaço entre certezas
caminhamos novamente meu Amor com as tuas mãos
nas nossas mãos entrelaçadas sobre o peito.

Que idade temos meu Amor ?... Qual a idade
que os velhos do Restelo nos dariam meu Amor
se nos vissem assim juntos apaixonados
celebrando uma sonata de Chopin à luz das velas ?...

Artisticamente incendiadas meu Amor
por um raio lazer que ainda brilha nestas taças
onde comemoramos estes cânticos que se abraçam
nestes sons de uma sinfonia no começo.

Abriram-se todos os círculos que nos rodeavam meu Amor
neste início reiventado junto do Mar
neste sonho remoído por silêncios
nesta velhice sábia de enganos e segredos.

Beijemo-nos então meu Amor deliciosamente
tão deleciosamente Amor!...
Tão devagar!...

Vem daí meu Amor vamos dançar
nesta nossa primeira viagem interplanetária!...

Se Renoir nos visse meu Amor se ele nos visse
talvez os seus pincéis se colorissem novamente
e nos pintassem meu Amor assim dançando
neste ambiente familiar que redescobrimos.

Ou reencontrámos meu Amor no esquecimento
que tinhamos ao partir ao deslocar
afinal meu Amor valeu a pena
vamos ouvir Beethoven de novo meu Amor.

Podemos agora envelhecer neste Milénio
com um ramo de flores no meu regaço para distribuir
por todos estes anos que perdemos longe do Mar
por todos estes anos que perdemos meu Amor.

Sempre a sonhar Amor!...
Sempre a sonhar!...

Fernanda Costa

Lisboa, 5 de Setembro de 2008
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